No nosso mundo de pós-realidade, não deveríamos estranhar qualquer coisa, mas algumas distorções nos afetam sem sequer termos consciência disso, o tal SMART e a diferença da sua leitura atual e da sua origem é surpreendentemente uma delas.
O SMART mais conhecido
Seus objetivos são SMARTs é uma pergunta recorrente em muitas empresas durante o período de planejamento, e confesso até pouco tempo era mais um dos que o trazia para o português como:
eSpecífico
Mensurável
Alcançável
Relevante
Temporal
Essa versão tem a beleza de trazer o termo Relevante, dando importância a quanto o objetivo seria relevante para quem o executa. Isso se aplica perfeitamente para os empreendedores. Empreender normalmente exige esforços significativos de recursos, tempo e dedicação. Nesse contexto a relevância é crucial para dar foco e justificar o custo pessoal e energético envolvido.
Mas como fica a relevância para os indivíduos numa empresa aonde os objetivos vêm de cima para baixo e cuja finalidade primordial é o lucro?
Eu posso achar relevante ter qualidade de vida, e trabalhar “somente” o tempo pelo que acredito estarem me pagando. Mas na reunião anual com acionistas dessa empresa, você não os verá e nem os conselheiros pedirem qualidade de vida, para o CEO e seus colegas, com sorte haverá uma nota sobre respeitar os direitos humanos, considerar questões de ESG e de compliance. No final existirão os objetivos financeiros que vão sedo cascateados e subdivididos de cima para baixo e objetivos complementares com “outros” tópicos socialmente esperados e “marqueteaveis”.
O meu relevante, é no fato e com sorte; oferecido, pode ser por exemplo, ajudar a produzir produtos com baixo impacto ambiental, e se sou alguém que se importa com o ambiente, posso ficar orgulho da minha colaboração com uma empresa que também se preocupa com o ambiente.
O SMART original
Em novembro de 1981[1], o artigo de George T. Doran, "Há uma maneira de S.M.A.R.T. de escrever as metas e objetivos da gestão" foi publicado em uma edição da Management Review. Em seu artigo, Doran delineou a base para o que se tornaria o conceito de metas SMART - uma abordagem popular de definição de metas defendida por profissionais e gestores em inúmeros setores e indústrias.
Quais eram os objetivos SMART?
"SMART" é um acrônimo ou mnemônico - com cada letra representando uma característica da abordagem de Doran. Ele acreditava que os objetivos deveriam ser:
eSpecífico conter objetivos centrais bem definidos
Mensurável Ter um elemento quantificável para servir como um indicador de sucesso
Atribuível (agora mais “alcançável") Ter uma pessoa designada para a tarefa ou objetivo
Realista (agora referido como "relevante") Trabalhar dentro do quadro de capacidades individuais ou de grupo com consideração ao tempo, recursos e prioridades
Tempo Ter um prazo estabelecido para cada objetivo
O que mudou.
Como está indicado acima, o agora Alcançável era Atribuível e o Relevante era Realista.
Apesar de não ter claro a sequência histórica que levou a essa mudança, imagino que algum colega consultor encontrou, através dessas alterações, um caminho muito mais vendável e menos limitante da proposta de “Doran”.
Olhando a abordagem atual como base, temos <Alcançável> substituindo <Atribuível>. Curiosamente <alcançável> é bastante genérico e abre um caminho para o tudo pode ser. Quem irá determinar o que é ou não alcançável? Eu que não nado mais que 200m sem perder o fôlego, posso dizer que nadarei 2.000m até o final do ano, outras pessoas nadam 2.000m e terei vários meses para treinar, observe que esse termo é diferente do outro termo original que foi excluído (realista) que poderia levar a análises incomodas, por exemplo, quantos dias terei que treinar por semana para multiplicar por 10 minha capacidade de nadar e isso seria realista se não treino nada por semana por que não tenho tempo e/ou disposição?
Já a exclusão feita do termo Atribuível é antagônica com qualquer metodologia de projeto, mas é normalmente compensada pela alocação posterior do responsável.
Mas o que me chama mais a atenção é a inclusão do termo Relevante, que permite a personalização e funciona mais como alavanca para a realização do que o termo original Realista, que pode ser visto como um possível freio. Na verdade, este termo permite que se avalie o risco de realização do objetivo
Com qual versão ficar?
A versão original, com os termos Atribuível e Realista, se aproxima mais de abordagens de gestão de projetos, por incluir de certa forma, atribuição de responsabilidade e análise de risco. Assim a sugiro mais para as abordagens top-down, pois permite um controle maior e com expectativas mais honestas de que propõem os objetivos e de que os aceita.
A versão corrente com os termos, Alcançável e Relevante é melhor quando a abordagem é botton-up, ou para estabelecer objetivos pessoais, onde o peso da atribuição de responsabilidade é menor, a sensação de poder alcançar motiva e a associação com aquilo que importa pessoalmente trás clareza de onde e porque a energia e tempo devam ser alocada.
Seus comentários e sugestões são sempre bem-vindos, se gostou por favor compartilhe e de um like.
[1] Livremente traduzido de: https://www.whatmatters.com/resources/okrs-smart-goals-difference-between
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